20 março 2025

Defesa da Europa, por: D. Quixote de La Mancha e Sancho Pança

(Carlos Matos Gomes, in Medium.com, 20/03/2025)

“Precisamos de uma mentalidade de defesa europeia a todos os níveis na Europa”, disse Costa durante a 164.ª sessão plenária do Comité das Regiões Europeu. repetiu o “mantra” da Europa ameaçada pela Rússia para justificar as colossais despesas em material de guerra previstas para os próximos anos e que, na verdade, servem para compensar a perda de lucros dos grandes grupos resultantes da perda de competitividade dos produtos europeus no mercado mundial, resultante em boa parte da política de substituição da energia barata importada da Rússia pela energia cara importada dos EUA, e da perda de mercados do antigo Terceiro Mundo para a China. “A guerra da Rússia contra a Ucrânia tem sido um ato de agressão, causando sofrimento humanitário. Mas também ameaçador para a segurança europeia”, alertou, ao defender que “nada sobre a guerra contra a Ucrânia pode ser decidido sem a Ucrânia” e que é necessário “intensificar os esforços para construir uma Europa da Defesa”, acrescentou.

O sr. Costa considerou que é necessária a “confiança dos cidadãos*” na capacidade de a Europa os defender. (*pagantes)

Mas defender de quem?

Este mantra assenta num conjunto de sofismas — isto é, de deturpações grosseiras. O primeiro é o da ameaça russa. A Rússia nunca atacou a Europa, e Europa é um conceito muito plástico e utilizado segundo as conveniências do pregador. A Rússia faz parte da Europa e da sua história e esteve envolvida nos conflitos europeus como todas as outras potências, da Suécia aos império austro-húngaro, e franco-prussiano, da França à Espanha e à Polónia.

A nova Europa é uma entidade criada pelos dirigentes europeus perdidos entre o final da administração Biden e o início da administração Trump e que ficaram na situação das moscas que caíram numa mancha de óleo se agitam muito sem sair do mesmo sitio. Esta Europa sem formas definidas é Bruxelas e é um produto dos funcionários de Bruxelasque andam em palpos de aranha para justificarem a existência e, mais difícil ainda, a sua utilidade.

Em desespero de perdas, a oligarquia europeia recorreu à velha solução da guerra e dos armamentos e colocou os seus agentes nos mais altos cargos da União Europeia a vender a ideia da invasão russa, da reconversão das fábricas de automóveis em tanks e das de latas de conserva em cartuchos dos operários em soldados.

A ideia seria boa, se não obrigasse os europeus a comprar um pacote de burlas tão valiosas como garrafas de ar de Fátima e a assumirem serem mentecaptos ou peregrinos chegados a um santuário de realidade virtual. 

Em Dom Quixote de La Mancha, Cervantes antecipou este delírio de ver castelos em moinhos, legiões em procissões, mas não chegou à desfaçatez de impor o pagamento do Rocinante, nem da lança de combate!

Na realidade, a Rússia, após três anos de invasão da Ucrânia, avançou 200 quilómetros e segundo informações ocidentais está próxima de atingir o máximo de potencial militar sustentável pela sua economia. A distância de Kiev a Paris é de 2400 quilómetros. O que significa que a este ritmo a Rússia necessitaria de 36 anos para atingir o centro da Europa. É evidente que esta contabilidade apenas serve para realçar o absurdo do tipo de argumentos dos armamentistas.

A desonestidade dos dirigentes europeus revela-se no que omitem e manipulam: a Ucrânia deixou de ter interesse enquanto objetivo militar e económico. Para a Rússia não serve de corredor de ataque à “Europa”, como revelam as dificuldades em avançar, mas também não serve para a “Europa”, mesmo rearmada, invadir a Rússia e conseguir o que nem Napoleão nem Hitler conseguiram, como o falhado contra ataque ucraniano apesar do maciço apoio ocidental demonstrou. Economicamente, as matérias-primas, os terrenos valiosos e infraestruturas já foram negociados pelo Reino Unido e principalmente pelos EUA. A Rússia, pelo seu lado, possui em quantidade todas as matérias-primas existentes na Ucrânia e basta-lhe o controlo dos portos do Mar Negro. O saque da Ucrânia está negociado entre os EUA e a Rússia. Assistimos apenas a cenas de disfarce que permitam à Ucrânia e à nova Europa saírem de cena sem humilhação. O anúncio do rearmamento da Europa faz parte da comédia de enganos com que os dirigentes europeus estão a iludir os europeus. Acontece que é um caríssimo número de ilusionismo.

Também não se vislumbra o interesse da Rússia em “invadir” a nova Europa que não dispõe de matérias-primas, que é um anão nuclear, que não domina tecnologias exclusivas, caso da Inteligência Artificial*, que não tem presença significa no espaço nem nas redes de informação e comunicação, que é vista pelo resto do mundo como uma antiga potência colonial, um anexo dos EUA ou um resto abandonado por estes, o que ainda é mais humilhante, o que ainda torna mais absurda a despesa em armamento para se defender de quem não vê vantagens na sua conquista, a Rússia, que compraria um saco de gatos historicamente causadores de perturbações locais e mundiais.

O rearmamento da Europa faz tanto sentido como comprar uma armadura e um arreio de prata para um burro velho e convencer os pagantes de que têm ali um cavalo de batalha que os defenderá de um inimigo imaginário. O Dom Quixote de La Mancha antecipou este cenário

* que não é inteligência mas um mecanismo informático em modelos de linguagem de grande escala.(Large Language Model ou LLM) 

RÚSSIA PARA AUMENTAR TERRITÓRIO PODE INVADIR AS BERLENGAS ! 

"... e as aldrabices da Ursula" 

16 março 2025

UCRÂNIA: Cessar-fogo?

Sim, mas com as condições da Rússia

(Miguel Castelo Branco, in Facebook, 13/03 de 2025, Revisão da Estátua)



Sentado à mesa da sala a trabalhar desde as 8 horas, vou seguindo a frenética ciranda de propagandistas, cada um mais macambúzio que os outros, uns de asa caída, outros ainda agarrados à tábua de salvação que anima os fantasistas. Particular nota para o desespero de Ferro Gouveia que vê o seu mundo de Alice desfazer-se e já nem disfarça.

Esta gente estava à espera que o dia terminaria com a submissão de Putin aos caprichos da delegação norte-americana enviada ao Kremlin, consubstanciada numa insólita cessação das hostilidades que era, obviamente, uma armadilha para a Rússia triunfante.

Elegantemente, disseram-lhes que nem pensar e que não haverá qualquer interrupção das hostilidades até que todos se sentem à volta da mesa onde será firmado o tratado reconhecido internacionalmente, pelo qual a Ucrânia será um Estado neutral, cederá pelo menos quatro oblasts e reconhecerá a soberania russa sobre a Crimeia. Além do mais, a Rússia retirará as suas armas nucleares da Bielorrússia e em contrapartida não haverá na Polónia, nos países bálticos, na Finlândia, na Noruega na Suécia quaisquer vetores nucleares.

Talvez, a firmeza russa resida no conhecimento que a administração americana possuirá do iminente colapso militar ucraniano, da incapacidade de os europeus ocidentais poderem dar seguimento à transferência de armas e de os EUA estarem à beira de uma grave crise de reservas em munições.

Os russos sabem-no, esperaram pacientemente e há dias ofereceram um singelo vislumbre do seu potencial ao derrotarem num movimento imparável e vertiginoso a frente norte ucraniana.

 Com o passar das horas, as fotos a que vamos acedendo mostram a extensão do desastre. Cerca de 700 peças – de artilharia, morteiros pesados, carros blindados, viaturas de transporte de infantaria, carros de combate e veículos de engenharia militar – caíram intactas em mãos russas.

Foi uma debandada tão manifesta que tudo se inclina para a possibilidade de dezenas de milhares terem simplesmente abandonado os seus postos, armas, munições e até reservas de combustível e fugido. Entre essas centenas de troféus passeiam-se despreocupados os jornalistas russos.

15 março 2025

Como fazer com que as dívidas astronómicas dos EUA

.. sejam pagas por outros

(Juan Manuel Olarieta, in Resistir, 15/03/2025)



Os acontecimentos estão a acelerar-se. Trump chegou à Casa Branca com um plano debaixo do braço, o mesmo que não conseguiu implementar em 2017. Trata-se exatamente de tornar a “América” grande de novo. Para isso, tem de pôr de lado o resto do mundo e concentrar-se apenas nisso:   nos seus próprios problemas internos.

Ler artigo completo aqui.

Necropolítica

Ucrânia e as negociações mediadas por Trump

(Constantin von Hoffmeister, in ArktosJournal, 13/03/2025, Trad. Estátua)


(Aqui deixo a moral que, pessoalmente, retirei deste excelente texto e que se aplica como uma luva à Ucrânia: “Quem não pode ser lobo mas lhe veste a pele, acaba a ser tratado como cordeiro a caminho do matadouro”.

Estátua de Sal, 14/03/2025)


O homem ocidental, o homem faustiano, perdido nas suas próprias ilusões, debatendo-se contra o destino enquanto finge que ainda pode esculpi-lo. O ciclo está travado, o Ocidente está no seu estágio final, onde as suas guerras se tornam rituais, e os seus líderes figuras vazias repetindo erros antigos com novas tecnologias.


O Congresso de Berlim de 1878 — onde os triunfos da Rússia no campo de batalha foram desfeitos por uma emboscada diplomática orquestrada pela Grã-Bretanha, Áustria-Hungria e um Bismarck friamente calculista — repete-se hoje, enquanto Trump interpreta o papel do “pacificador imparcial”, garantindo que o destino da Ucrânia seja determinado não pela guerra, mas pelo cálculo necropolítico do Império, onde a sobrevivência é racionada, a soberania é uma ilusão e o poder pertence apenas àqueles que decidem quem deve perecer e quem tem permissão para persistir.

Um século e meio atrás, o sangue derramava-se no Oriente como uma maré inchada que não sabia como recuar. A Guerra Russo-Turca (1877-78) havia atingido o seu clímax, e o exército russo, endurecido por batalhas brutais nos Bálcãs, estava a uma distância impressionante de Constantinopla — Tsargrad, o sonho imperial do mundo ortodoxo. As forças otomanas sofreram uma derrota devastadora em Pleven, na Bulgária, os seus domínios europeus rapidamente a escorregarem para as mãos de rebeldes eslavos e baionetas russas. Restava apenas uma curta distância antes que as tropas russas pudessem levantar as suas bandeiras sobre o Corno de Ouro — o porto natural estratégico de Constantinopla que havia salvaguardado as defesas navais da cidade por séculos — e, ainda assim, como a história frequentemente dita, a marcha da espada foi interrompida pelo esquema da diplomacia. A vitória estava próxima, mas a diplomacia, como nos lembra o teórico político alemão Carl Schmitt (1888-1985), nunca é neutra. É uma guerra por outros meios, um campo onde os vencedores muitas vezes são aqueles que não lutam.

A Grã-Bretanha, alarmada com a perspetiva do domínio russo nos Balcãs e uma potencial frota russa no Mediterrâneo, agiu rapidamente. A Frota Britânica do Mediterrâneo entrou nos Dardanelos, sinalizando que qualquer avanço russo seria recebido com guerra. A Rússia, militarmente exausta após anos de conflito brutal e pesadas baixas, viu-se incapaz de arriscar outro confronto. A Áustria-Hungria, temerosa da crescente influência russa nos Balcãs, também ameaçou uma intervenção militar. A Alemanha, que a Rússia esperava que apoiasse a sua posição, em vez disso jogou o jogo frio de equilíbrio de Bismarck, aliando-se à Grã-Bretanha e à Áustria para garantir que nenhuma potência dominasse a Europa. A Rússia, diplomaticamente isolada e sem aliados para apoiá-la, teve pouca escolha a não ser submeter-se ao Congresso de Berlim de 1878, onde as suas vitórias foram divididas como despojos através de um acordo secreto.

O Tratado de San Stefano, que havia garantido à Bulgária independência quase total e expandido maciçamente a influência russa, foi reescrito sob pressão britânica e austríaca. O novo Tratado de Berlim restringiu a autonomia da Bulgária, devolveu grande parte do território otomano que a Rússia havia libertado e reduziu o domínio da Rússia sobre os Balcãs. A Grã-Bretanha, não tendo feito nada além de ameaçar, foi-se embora com o Chipre, enquanto a Áustria-Hungria recebeu o controlo da Bósnia e Herzegovina. A Rússia, embora humilhada diplomaticamente, aceitou esse retrocesso por necessidade: a guerra com a Grã-Bretanha e a Áustria teria sido suicida, a agitação revolucionária estava a formar-se em casa e o czar calculou que os interesses russos poderiam ser promovidos por meio da paciência em vez do confronto imediato. Schmitt teria rido da ingenuidade daqueles que ainda acreditavam na justiça como algo diferente de uma expressão de força. O político é sobre decidir, e aqueles que estavam sentados à mesa já haviam decidido: a Rússia podia lutar, mas não podia governar.

A distinção amigo-inimigo de Schmitt revela que a verdadeira luta pelo poder não é decidida no campo de batalha, mas no rescaldo, onde os vencedores definem a nova ordem política determinando quem mantém a legitimidade e quem deve ser contido. Até mesmo o sucesso militar pode ser fútil se uma nação for reclassificada de potencial “amigo” em “inimigo” restrito aos olhos dos poderes dominantes, como a Rússia experimentou quando os seus triunfos no campo de batalha foram minados pela contenção diplomática no Congresso de Berlim, provando-se que o controlo sobre a tomada de decisões políticas — não apenas a força militar — dita, em última análise, a forma da História.

O passado coagula e endurece, mas permanece inacabado, e agora está a repetir-se com um novo elenco de jogadores imperiais. Desta vez, o papel da Alemanha pertence aos Estados Unidos, uma nação que finge odiar o Império enquanto se amarra ao mastro da guerra perpétua. A Grã-Bretanha ainda é a Grã-Bretanha, sempre aquele chacal gorduroso e sorridente, sussurrando nos ouvidos dos seus aliados enquanto barganha os destinos de outros povos.

O exército da Ucrânia — apodrecendo em tempo real, perdendo terreno, perdendo homens, perdendo a esperança — manca pelos campos dos mortos, e cada nova derrota sublinha o inevitável. Então agora, em nome da ordem, ou da paz, ou de qualquer outra palavra que os tecnocratas usem para fazer a aniquilação parecer civilizada, a Rússia é chamada à mesa. Não para vencer. Nunca para vencer. Mas para “resolver” as coisas, o que no léxico do poder global significa diluir e atrasar.

O presidente Trump tropeça no espetáculo, envolto numa máscara de carnaval de diplomacia, um guru de negociação de reality show, como se o capitalismo tivesse dado à luz um acordo que não foi uma fraude desde o início. Mas essa também é a lógica da soberania que Schmitt descreveu — a exceção define a regra, o soberano é aquele que decide sobre o estado de exceção, e Trump, desempenhando o seu papel absurdo, detém esse poder agora.

O colapso de Kiev não é apenas uma questão militar. É uma crise existencial para a ordem liberal, que prospera apenas na presença de um inimigo externo que pode manter perpetuamente meio morto. Então Trump montou o teatro perfeito: primeiro, espremer Zelensky, colocá-lo de pé, garantir que ele assine um contrato que retire da Ucrânia quaisquer recursos que ela ainda finja possuir. Mas o consentimento não é real na necropolítica, onde os fracos assinam tratados não por vontade, mas porque as suas cabeças já estão submersas. As últimas duas semanas foram um longo exercício para afogar Kiev antes de lhe dar um canudo para respirar. Moscovo, desempenhando o seu papel com distanciamento clínico, emite o seu ultimato. A delegação americana retransmite-o. Kiev, sobrecarregada pela pressão, capitula instantaneamente. O roteiro desenrola-se.

A lógica da necropolítica, como teorizada pelo historiador camaronês Achille Mbembe (n. 1957), é exposta na coreografia destas negociações. Não se trata apenas de guerra, mas da gestão da morte em si, do controle estratégico de quem pode viver e quem é deixado para perecer. Para a Ucrânia, a existência depende da sua utilidade para poderes maiores, um peão cujo sofrimento não é uma tragédia, mas uma necessidade calculada. A retenção de armas, o racionamento de inteligência, a oferta de um cessar-fogo – não como salvação, mas como uma forma de prolongar um estado de limbo entre a sobrevivência e a destruição — isso é a necropolítica em ação.

Os EUA não precisam que a Ucrânia vença. Só precisam que a Ucrânia não morra depressa demais. O verdadeiro horror é que os decisores já aceitaram o eventual fim da Ucrânia. O que está sendo negociado é o ritmo de sua morte.

Isso não é guerra no sentido clausewitziano de dois atores soberanos competindo pela vitória. É uma guerra no sentido schmittiano, onde um lado é um objeto em vez de um sujeito, um campo de batalha em vez de um comjpetidor. Os EUA não usam meramente a Ucrânia. Eles governam as condições da vida dela e da sua inevitável extinção.

O que Trump oferece? Um cessar-fogo — uma coleira. Trinta dias. Uma pausa, que na realidade não o é porque uma pausa só importa se o sujeito for capaz de se movimentar de forma independente. E a Ucrânia não é. Uma breve janela para se rearmar, não porque a América se importe com a vitória ucraniana (não se importa), mas porque ainda precisa do país como um porrete contra a Rússia. As armas, que foram retidas como comida de um cão vadio, retomarão o seu fluxo, um gota-a-gota controlado projetado para manter o cadáver a contorcer-se, e para estender o sofrimento por tempo suficiente para servir à sua utilidade. A inteligência também será restabelecida porque um exército cego perante o seu inimigo já está morto. Até a América já está a começar a interrogar-se sobre se essa experiência catastrofica em câmara lenta pode acabar mais cedo do que o esperado. O sujeito pode expirar antes que o ato final seja escrito. O rato de laboratório pode não conseguir passar pelo labirinto. E então o que acontecerá? O que acontecerá quando não houver mais ninguém para lutar em nome da “ordem baseada em regras”?

E há a Europa, o grande império moribundo disfarçado duma coleção de estados-nação, tentando abrir caminho na conversa. Trump, com sua indiferença habitual, encolhe os ombros e diz, claro, deixe-os entrar. Mas a Rússia — a velha sobrevivente da História — já jogou esse jogo antes. Ela rejeitará o cessar-fogo. Deve. Isso não é diferente de Minsk, não é diferente de toda paz que não é paz, mas um meio de garantir que a guerra continue sob condições diferentes. A Rússia vê a armadilha e ignora-a. Ela recusará o acordo, e Trump levantará as mãos. Um gesto para as câmaras, um movimento vazio, um encolher de ombros da história. E no fundo, o fantasma de Schmitt murmura: “Política é sobre decidir, e vocês, pequena nação da Ucrânia, não têm o direito de decidir.”

O pensador histórico alemão Oswald Spengler (1880-1936) viu isso. Spengler escreveu com a tinta dos condenados, uma profecia vestida de análise, dizendo-nos que a história não é progresso, mas declínio, uma grande decomposição civilizacional fingindo ser movimento.

O homem ocidental, o homem faustiano, perdido nas suas próprias ilusões, debatendo-se contra o destino enquanto finge que ainda pode esculpi-lo. O ciclo está travado, o Ocidente está no seu estágio final, onde as suas guerras se tornam rituais, e os seus líderes figuras vazias repetindo erros antigos com novas tecnologias.

Spengler chamou a isso o inverno da civilização, o momento em que as decisões se tornam reações, quando os impérios se alimentam de sua própria decadência. As negociações na Arábia Saudita são outra cena da tragédia, outro embaralhamento das cadeiras do convés no Titanic do Império. O jogo, no sentido mais grandioso, foi decidido há muito tempo.

Quanto à colonização da Roménia



(Joseph Praetorius, in Facebook, 12/03/2025, Revisão da Estátua)



A questão das presidenciais romenas 
tornou-se problema comum 
dos povos da Europa.

A questão fundamental está perfeitamente colocada. É a de um país a quem prometeram a prosperidade e a paz, ao mesmo tempo que o encaminham para a guerra, querendo assenhorear-se dos seus recursos e compensando-o com míseras subvenções – a minhoca na ponta do anzol – o que se projeta como um negócio do outro mundo. Querem retirar tudo o que naquela terra há. O gás, o petróleo, o oiro serão evidentemente outras tantas razões para tornar, pela pilhagem, os romenos mais pobres.

Não falando já das próprias vidas, neste insulto supremo da transformação do país em fornecedor de carne barata para canhão.

Colonialismo puro e duro. De modelo arcaico. Capaz de transformar um povo antigo e nobre em novos negros-brancos. E a sua amada Pátria em colónia nova.

Em número crescente, os romenos começaram a notar mais do que o projeto, a sua execranda concretização. É tão desleal! Os romenos olhavam com evidente afeto para esta gente “ocidental”, como ainda dizem, aí admirando a liberdade, a prosperidade, o desenvolvimento, a elegância, a arte, a música, as literaturas… E esta infecta escumalha faz-lhes isto. Transforma-lhes a Pátria em testa-de-ponte para o ataque à Rússia.

Os romenos – os contemporâneos, pelo menos – não morrem de amores pela Rússia, em razão das questões da Bessarábia e do correspondente desfecho após a Segunda Grande Guerra. Esquecem-se que a Bessarábia foi libertada pela Rússia, em guerra contra os turcos. E pelo anseio de unidade com aquele território, fizeram muitos sentirem-se como se tivessem herdado a posição turca no conflito local… E pegando nessa antipatia, acrescida pelo desfecho da guerra da Roménia com os vizinhos – sem esperança de socorro, ou sequer decência, dos simpáticos ocidentais, o que atirou a Roménia para a aliança com a Alemanha -, pegando nessa antipatia, queriam e querem, agora, atirar a Roménia contra a Rússia, consumando a sua transformação em alvo militar, na perspetiva da defesa russa.

Era o que faltava…

E os romenos reagem, dir-se-ia, inesperadamente. Votaram contra o sistema colonial já implantado. Votaram pela paz. E os cabos cipaios anularam as eleições. E vedam ao candidato qualquer nova candidatura, a quatro dias do prazo para as apresentações de candidaturas. Absoluta ignomínia.

A corja de Bruxelas assume o protagonismo de tal coisa, chegando a dizer que, sendo necessário, fariam o mesmo na Alemanha. Os embaixadores da UE em Bucareste tomam posição pública apoiando os cipaios do Tribunal Constitucional, enquanto o tribunal de Soros – o TEDH – rejeita a análise da queixa de Georgescu.

No segundo episódio, o embaixador francês reúne com os cipaios do “Tribunal Constitucional” antes da rejeição da candidatura. Ora, nem a anulação das eleições, nem a rejeição da candidatura têm qualquer fundamento legal. Georgescu não foi condenado, nem há motivo para qualquer condenação, muito embora, com o aparelho judicial neste estado, tudo pareça ao alcance de qualquer encomenda do poder colonial…

Atentas as percentagens eleitorais e a indignação dos romenos – a ampliar consideravelmente o apoio a Georgescu – o poder colonial rompeu qualquer influência dos seus cipaios entre o povo romeno. E apenas lhe resta a força. Tornaram-se odiosos e isso não se dissiparia em menos de duas gerações, se acaso pudessem estar sossegados tanto tempo. E não vão poder.

Assim sendo, é preciso esperar os três dias que faltam para o fim do prazo de apresentação de candidaturas. Há um plano B? Há assinaturas já reunidas que possam sustentar outra candidatura com o mesmo propósito de emancipação nacional? Se houver, tudo pode ser salvo e os cipaios serão remetidos ao seu lugar, preferencialmente no cárcere.

Se não houver essa possibilidade, a vida política romena entrará em fase de (muito) perigosa turbulência, quanto à qual talvez seja de relembrar a conclusão de Tomás de Aquino, no tema da insurreição contra os tiranos. “Não será desprovido de êxito, o que se comete com o favor da multidão” (devendo lembrar-se, também, que multidão é ali uma das aceções de povo, que Aquino define como “multidão racional, organizada na comunhão concorde das coisas que ama“.

Aguardemos.

Segue vídeo abaixo sobre a Roménia, a ver no Youtube.